segunda-feira, 30 de junho de 2008

Crítica - "Vertigo"

por Filipe Coutinho
(Esta crítica pode ser lida na integra em "Cinema is my Life")

Nota:

A cada filme que passa, fico cada vez mais fascinado com a compreensão que Hitchcock detém da mente humana. É de facto, um psicólogo cinematográfico que não encontra limites para criar insegurança e medo nos que visualizam os seus filmes. Dentro do terror/suspense tivemos filmes como "Psycho" e "The Birds" que conseguiram afastar muitas pessoas das suas banheiras assim como fez com que ganhassem um respeito muito mais acentuado pelos pássaros. Dentro do thriller/mistério, Hitchcock ofereceu-nos "Rear Window" e este "Vertigo" que realçaram a obsessão e a paranóia inerente à vontade da mente humana em ir além da curiosidade. É por isto que Hitchcock se tornou em uma lenda da sétima arte e é precisamente por isto que é considerado um dos melhores realizadores que já habitaram neste planeta.

"Vertigo" conta a história do detective John Feguson (James Stweart) que, após a morte do seu colega de profissão, decide retirar-se da força policial devido às vertigens que aterrorizam o seu dia-a-dia. Gavin Elster (Tom Helmore), um velho conhecido de Ferguson, convence-o a voltar ao papel de detective quando lhe propõe que este siga a mulher de Elster, de seu nome Madeleine Ester (Kim Novak), convencido que esta está com graves problemas psicológicos. Aquele que parecia um trabalho fácil cuja única dificuldade basearia-se em relatórios periódicos, transforma-se em uma tarefa obsessiva e alucinada quando Madeleine se revela bem mais complexa do que parece e o detective Ferguson apaixona-se por esta.


Tudo em "Vertigo" parece cuidadosamente produzido e, realmente, nada se baseou em um simples acaso. Hitchcock havia estado em São Francisco e sempre considerou que aquela magnífica cidade seria o cenário ideal para uma história de mistério e obsessão, tudo gravado através de um propositadamente induzido intenso nevoeiro que cria uma tensão exponencialmente assertiva. Como é óbvio, a cabeça do mestre do suspense começou a explodir de criatividade e o desafio era agora encontrar um argumento que se identificasse com as ideias do realizador. Este passou vários meses a conceber a história e só depois começou a requerir os ditos argumentos. Só a terceira tentativa se revelou satisfatória e, assim, finalmente começou a produção. Tudo estava testado e as rodagens estavam prontas a iniciar. Eis senão quando a actriz Vera Miles anunciou a sua gravidez que, por conseguinte, a impedia de rodar a fita. Foi então que Hitchcock começou a pesquisar alternativas e descobriu a bela Kim Novak. O sucesso de uma obra de um génio estava prestes a ser concebida.

Relativamente às interpretações contamos com um gigante James Stweart cuja actuação é assombrosa e deveras psicótica, conseguindo criar uma ligação extremamente intrínseca com a sua personagem. De facto, não é por acaso que James Stweart é considerado, pela American Institute of Film (AIF) como um dos melhores três actores da história da sétima arte. O seu papel é tão convincente que nos transporta por completo para aquele universo de obsessão. A última hora de fita é aquela onde melhor exemplifica o potencial enquanto muito prestigiado actor e, apesar de algumas reservas, quase que considero este o melhor papel de James Stweart. De resto, é uma das melhores parcerias vistas em cinema. Refiro-me à relação entre Hitchcock e Stweart que no passado também havia resultado em outra obra-prima, de seu nome “Rear Window”, onde o voyerismo e a paranóia são os temas em maior destaque. Kim Novak é a femme fatale e também por isso considero esta obra como um thriller com contornos noir que são inevitavelmente belos. Novak é brilhante não ficando nada atrás do seu colega de profissão oferecendo-nos uma performance multi-esquemática e versátil. Aquela que começou por se tornar uma simples substituta revelou-se uma autêntica estrela repleta de um misteriosismo intrigante e viciante. Outros papéis secundários como o de Tom Helmore são notáveis e elevam a qualidade do filme a outro nível. Da realização de Alfred Hitchcock pouco mais há a salientar exceptuando o facto de que apostou numa abordagem ligeiramente diferente recaindo em um noir menos específico mas mais minucioso.

Em termos artísticos destaca-se a sonoplastia que é qualquer coisa de extraordinária, já que consegue criar uma tensão arrepiante manipulando o espectador a seu bel-prazer. Também os cenários com São Francisco como pano de fundo são maravilhosos e tornam-se cada vez mais enigmáticos devido ao nevoeiro imposto pelo realizador que torna toda a história bem mais paranóica e hipnótica. Também a fotografia é de uma beleza noir que se associa claramente a todo o filme.

Pensar que quando “Vertigo” foi lançado, o seu sucesso foi escasso é quase um crime tendo em conta que estamos perante uma obra de uma qualidade cinéfila simplesmente fabulosa. Arrisco a dizer que é “A” obra-prima de Hitchcock. Felizmente o tempo tem destas coisas e encarregou-se de colocar esta fita no pódio. Por tudo isto, parece-me evidente que a nota máxima é justificada, quer em valor quer em estrelas. Este é daqueles filmes de visualização obrigatória. Não considero a fita previsível como alguns afirmam e o final é dotado de uma magnificência que deixa qualquer um boquiaberto. Simplesmente genial e obrigatório.

A frase:
"You shouldn't keep souvenirs of a killing. You shouldn't have been that sentimental. "

Ante-Cinema# / Cinema is my Life

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