Talvez nunca um diálogo de um filme esteve tão próximo da realidade para um actor. Mickey Rourke, que viveu por muito tempo escondido do cinema, teve agora a tão esperada e bem-vinda oportunidade de voltar a dizer ao mundo:
"Eu estou vivo!". Em 2005, Rourke voltava a chamar a atenção do cinema quando através da visão de Robert Rodriguez, este apareceu de forma muito peculiar e com um papel algo importante em
Sin City. De seguida, foi Tony Scott que voltou a pegar nele, incluindo-o mais uma vez num dos seus filmes, desta feita com
Domino. Foi, então, que o aclamado e visionário realizador Darren Aronofsky, lhe fez uma proposta que ele não podia recusar. Segundo se consta, inicialmente a produtora do filme queria dar o papel de Randy "The Ram" Robinson a Nicolas Cage. No entanto, Aronofsky não estava para aí virado, e com a recusa de Cage para desempenhar o papel, as portas abriram-se para Mickey Rourke. Tendo Aronofsky proposto a Rourke que este fizesse o filme mas que só no final da rodagem é que iria ser pago, também lhe prometeu que se fizesse este
The Wrestler as coisas poderiam mudar e muito na sua carreira, chegando-lhe ainda a falar numa possibilidade para uma nomeação ao
Oscar. Tanto assim foi que, meses depois, Rourke voltou a ser falado pelo mundo e a Academia não se esqueceu de nomear o actor rejuvenescido das "cinzas".
Apesar de ter optado por começar esta crítica pelo desempenho e rejuvenescimento de Mickey Rourke, era muito injusto se dissesse que o filme vive apenas disso. Tanto assim não é que, ao longo do filme, vemos uma vez mais uma realização muito sólida e eficaz de Darren Aronofsky, e actores secundários que complementam muito bem os sentimentos e desenvolvimento da personagem de Rourke ao longo do filme. Mas, como é óbvio, o grande triunfo de
The Wrestler é o excelente e nunca visto desempenho de Rourke. Mas se este tem a capacidade de transportar para fora do ecrã os seus mais profundos sentimentos, é a câmera de Aronofsky o principal mentor deste aspecto. Sempre a segui-lo de maneira a transmitir os diferentes aspectos que a sua personalidade enfrenta, desde os momentos mais difíceis como a falta de dinheiro e amigos, até à própria solidão de "The Ram" quando não está nos ringues, o realizador que já mostrou toda a sua mestria em filmes como
Requiem for a Dream e
The Fountain, volta a triunfar num dos registos mais sentimentais da sua carreira.
Apesar de Mickey Rourke não ter ganho o
Oscar para Melhor Actor Principal, conforme muitos pensavam, inclusive eu, fica pelo menos a prova de que o seu talento sempre esteve com ele e que muitos outros projectos de grande qualidade podem surgir na sua carreira. A certa altura, antes dos
Oscars, Rourke afirmou que não ganhar o
Oscar podia muito bem acontecer dado os "inimigos" que fez durante algum tempo na industria de Hollywood. No entanto, se novos desempenhos como este não surgirem, fica pelo menos um registo interpretativo que marcou pela positiva a sua carreira. Ainda neste aspecto sobre os prémios da Academia, e tendo em conta que aqui se podia falar de muita coisa em relação a este
The Wrestler, pergunto o porquê de este filme ter estado ausente em mais categorias dos
Oscars. Falo, por exemplo, em categorias como a de Melhor Filme, Realizador, Actriz Secundária para Evan Rachel Wood e Música Original. Ao ver a lista de nomeados para Melhor Filme, retirava por exemplo
The Reader, que, para mim, foi um filme bastante sobrevalorizado pela Academia, e assim incluir este
The Wrestler. Depois, Evan Rachel Wood apresenta-nos um grande interpretação, sendo ela uma das causas maiores para o desempenho de Mickey Rourke conforme o vimos. No entanto, nesta categoria das Secundárias, teve em sua "representação" Marisa Tomei, que levou para a sua carreira mais uma justíssima nomeação por este
The Wrestler. Por último, se a música "Down to Earth" de Peter Gabriel foi nomeada, gostava de saber o que é que esta tem a mais que a do Bruce Springsteen.
No geral, e porque esta crítica já vai longa, é importante registar que não sendo este o melhor filme de Darron Aronofsky, porque à frente ainda se encontra um genial
Requiem for a Dream, este
The Wrestler é, sem dúvida alguma, um dos filmes mais marcantes e pessoais que o realizador já alguma vez fez. São praticamente duas horas a acompanhar um solitário lutador que tenta lutar contra a naturalidade do tempo e da vida mas, acima de tudo, um homem com um sentimento ainda por explorar. É de registar a forma como o filme desenvolveu o seu final, não entrando nos habituais clichés do género. Um filme para ver e rever.
"A temática que mais sobressai no vasto rol de emoções que é “The Wrestler” é, sem qualquer margem para dúvidas, a solidão. (...) Em suma, temos uma obra equilibrada que não transcende a excelência ao nível da qualidade cinéfila mas que se tornará, muito provavelmente, numa referência em um futuro distante."Ante-Cinema#